segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Marjane compôs uma história em quadrinhos que apresenta um diálogo entre a narrativa tradicional sobre a Independência do Brasil e uma nova narrativa aberta para o futuro. A narrativa tradicional, fundadora da identidade nacional, é incorporada sob uma nova interpretação, vinculada à liberdade e dignidade humanas como um princípio universal que, antes, estava vedada aos brasileiros. A narrativa dessa jovem põe em dúvida as precisões dos marcos espaciais, e dos acontecimentos que levaram à Independência. Nas três primeiras tarjas expressa essas dúvidas quanto à realidade das experiências ligadas à localização do evento no rio Ipiranga, e da existência da carta recebida por D. Pedro I neste local. O caráter evanescente das imagens alternativas é flagrante, pois em um balão do segundo quadrinho a palavra Independência aparece só parcialmente como que desaparecendo da imagem. A narrativa afirma, na quarta tarja, que D. Pedro I realmente existiu e evitou que uma guerra civil acontecesse. A ideia de guerra esta representada pela expressão “o pior acontecesse” e pela imagem alternativa de duas espadas se digladiando. Aparentemente, a narrativa, a partir desse ponto, toma um rumo de afirmação da imagem da bandeira imperial e da clássica frase “Independência ou morte”; mas o valor que mobiliza esses quadros, à primeira vista tradicionais, é a liberdade, que no início está vinculada às ações e intenções de D. Pedro I. Mas no último quadrinho, mesmo com a referência temporal à data de 7 de setembro, a liberdade sai da referência a este personagem histórico e passa a ser compartilhada por todos os brasileiros com a frase “começamos a lutar por nós mesmos”. O diálogo entre imagens canônicas e imagens alternativas parece revelar que D. Pedro era uma espécie de estopim para algo que este personagem nem imaginava: a busca da liberdade do povo brasileiro, no qual Marjane se define como integrante, pois sempre usa a primeira pessoa do plural e o pronome possessivo “nosso”. É perceptível que, para evitar o poder dos ícones canônicos, essa jovem não representou o personagem D. Pedro, mas somente a sua fala, como se fosse uma senha para uma mudança histórica estrutural que sequer tinha imaginado: o processo histórico que culminou, no futuro do passado, com a liberdade de todo o povo brasileiro que a toma em suas mãos. Possivelmente, esse é o significado da invisibilidade desse personagem nos quadrinhos. Essas imagens alternativas incorporam um passado trágico em prol de uma expectativa de futuro pautada na esperança de liberdade de todos os brasileiros em relação a qualquer forma de opressão.
A INDEPENDÊNCIA DO BRASIL Para entender como o processo histórico relativo à Independência do Brasil é compreendido na cultura histórica contemporânea brasileira deve-se considerar três fatores que estão intimamente relacionados: a invenção de uma tradição dos feriados nacionais e, portanto, em um mito de origem; a tradição popular de uma comunidade, como a presença de um passado encapsulado (inconsciente) na memória histórica dos brasileiros; e a cultura escolar. Esses estão relacionados à expressão de uma consciência histórica tradicional entre estes estudantes, professores e demais cidadãos neste país. Pode-se afirmar, quanto à criação de tradições de feriado nacional e a constituição de uma tradição popular, que a Independência do Brasil, com os seus respectivos marcos históricos, (tais como o Grito da Independência; a memória do local onde se supõe que aconteceu o “grito” realizado por D. Pedro I e seus soldados, às margens do Ipiranga [referenciada inclusive na letra do Hino Nacional Brasileiro]; e as constantes comemorações ao dia 07 de setembro de 1822) permitiram a constituição de uma identidade nacional unificada entre os brasileiros. Isso fica evidente quando se considera, no campo da cultura escolar, o modo como os autores dos livros didáticos de História abordam esse tema como uma verdade única pautada em uma interpretação de um processo inevitável e inquestionável: a constituição de um Império do Brasil independente de Portugal organizado em uma monarquia parlamentar pela dinastia portuguesa dos Bragança. Associada a essa interpretação está o predomínio de imagens canônicas ligadas ao dia da Independência produzidas desde o século XIX, as quais ajudaram a sedimentar a ideia de libertação do povo brasileiro, no dia 7 de setembro de 1822. Um exemplo bem sucedido deste fenômeno está ligado à pintura a óleo Independência ou morte, de Pedro Américo, popularmente conhecida como O grito do Ipiranga, produzida em 1888, às vésperas da proclamação da república brasileira. O sucesso e a popularização desta obra ficam patentes pela sua presença nos livros didáticos de História e pela sua divulgação na mídia que vai além da escola, tais como filmes e histórias em quadrinhos. A primeira produção relevante em relação ao cinema é o filme de 1972, “Independência ou Morte!”, dirigido por Carlos Coimbra e estrelado por Tarcísio Meira, em que D. Pedro I proclama a Independência do Brasil às margens do rio Ipiranga, em São Paulo, e depois é coroado primeiro imperador do país. (É possível ver essa imagem em http://www.youtube.com/watch?v=mheime48ibA&feature=related). Essa cena da Independência foi claramente inspirada no quadro de Pedro Américo, atestando, portanto, o fato de que a disseminação dessa imagem já se constituía como um elemento do imaginário da identidade nacional brasileira. É importante lembrar que este filme foi financiado pela pelo governo Médici, quando os representantes da Ditadura Militar brasileira (1964-1985) tentavam se apropriar do imaginário popular sobre a independência do povo brasileiro.
Semana passada ouvi de um grande amigo uma grande verdade: “Chega uma hora na vida que você tem que abrir mão do selvagem dentro de você para manter amigos, empregos e constituir família. Ou você pode escolher ser um louco e viver sozinho.” No meu último emprego, quando pedi demissão, ouvi do meu chefe, também um grande homem em raras ocasiões: “Toda essa sua mania de ser louquinha e falar o que pensa, só vai te garantir um emprego fixo: banda de rock.” Acho que todos têm razão. E venho tentando, com orações dadas pela minha mãe desesperada com meu jeitinho nada meigo, yoga, terapia, sexo, pilates, mantras e muita conversa com amigos em geral, ser uma pessoa mais equilibrada. Uma amiga me disse: “Quem briga por tudo e quer medir poder com todo mundo, na verdade está tentando provar que não é um bosta, tá brigando consigo mesmo”. Pura verdade, quando minha auto-estima está em suas piores fases, é aí que a coisa pega: fico com mania de perseguição, acho que tá todo mundo querendo foder comigo, que existe um complô universal contra a minha frágil pessoa. Meu ataque nada mais é do que a defesa amedrontada de uma menina boba. Mas a verdade é que eu odeio o equilíbrio. Porra, se eu tô puta, eu tô puta! Se eu tô com ciúme, não vou sorrir amarelo e mostrar controle porque preciso parecer forte e bem resolvida. Se o filho da puta que senta do meu lado é um filho da puta, eu não vou fazer política da boa vizinhança, eu vou mais é berrar e libertar essa verdade de dentro do meu fígado: você é um grandessíssimo filho de uma puta! Se a vaca da catraca do teatro me tratou mal, eu vou mais é falar mesmo que ela é uma horrorosa que não vê pica há anos, ou melhor, que a última pica que viu foi do padrasto que a estuprou! O sangue ferve aqui dentro, e eu não tô a fim de transformá-lo num falso líquido rosa que um dia vai me dar um câncer. Eu não tô a fim de contar até 100, eu quero espancar a porta do elevador se ele demorar mais dois segundos, quero morder o puto do meu namorado que apenas sorri seguro enquanto eu me desfaço em desesperos porque amar dói pra caralho, quero colocar TODAS as pessoas do meu trabalho que falam “Fala, floRRRR!” ou “Precisamos disso ASAP” numa câmera de gás peristáltico. Eu sou antipática mesmo, o mundo tá cheio de gente brega e limitada e é um direito meu não querer olhar na cara delas, não tô fazendo mal a ninguém, só tô fazendo bem a mim. Minha terapeuta fala que eu preciso descobrir as outras Tatis: a Tati amiga, a Tati simpática, a Tati meiga, a Tati que respira, a Tati que pensa, a Tati que não caga em tudo porque deixou a imbecil da Tati de cinco anos tomar as rédeas da situação. Ela tem razão, mas é tão difícil ver todos vocês acordando de manhã sem nada na alma, é tão difícil ver todos os casais que só sobrevivem na cola de outros casais que só sobrevivem na cola de outros casais, é praticamente impossível aceitar que as contas do final do mês valham a minha bunda sentada mais de 8 horas por dia pensando o quanto eu odeio essa gente que se acha “super” mas não passa de vendedor de sabonete ambulante. É tão difícil ser mocinha maquiada em vestido novo e sapato bico fino quando tudo o que eu queria era rasgar todos os enfeites e cagar de quatro no meio da pista enquanto as tias chifrudas bebem para esquecer as dúvidas ao som de “Love is in the air”. Parem de sorrir automaticamente para tudo, humanos filhos da puta, admitam que vocês não fazem a menor idéia do que fazem aqui. Admitam a dor de estar feio, e admitam que estar bonito não adianta porra nenhuma. Eu já me senti um lixo de pijama com remela nos olhos, mas nunca foi um lixo maior do que me senti gastando meu dinheiro numa bosta de salão de beleza enquanto crianças são jogadas em latas de lixo porque a total miséria transforma qualquer filho de Deus em algo abaixo do animal. Mas eu não faço nada, eu continuo querendo usar uma merda de roupinha da moda numa merda de festinha da moda no meio de um monte de merdas que se parecem comigo. Eu quero feder tanto quanto eles para ser bem aceita porque, quando você faz parte de um grupo, a dor se equilibra porque se nivela. E eu continua perdida, sozinha, achando tudo falso e banal. Acordando com ressaca de vida medíocre todos os dias da minha vida. Grande merda de vida, você muda a estação do rádio para não reparar que a menina de dez anos parada ao lado do seu carro, já tem malícia, mas não tem sapatos. Você dá mais um gole no frisante para não reparar que a moça da mesa ao lado gostou do seu namorado, e ele, como qualquer imperfeito ser humano normal, gostou dela ter gostado. Você disfarça, a vida toda você disfarça. Para não parecer fraco, para não parecer louco, para não aparecer demais e poder ser alvo de crítica, para ter com quem comer pizza no domingo, para ter com quem trepar na sexta à noite, para ter quem te pague a roupa nova e te faça sentir um bosta e para quem te pede socorro, você disfarça cegueira. Você passa a vida cego para poder viver. Porque enxergar tudo de verdade dói demais e enlouquece, e louco acaba sozinho. Vão querer te encarcerar numa sala escura e vazia, ninguém quer ter um conhecido maluco que lembra você o tempo todo da angústia da verdade e de ter nascido. Você passa a vida cego, mentindo, fingindo, teatralizando o personagem que sempre vence, que sempre controla, que sempre se resguarda e nunca abre a portinha da alma para o mundo. Só que a sua portinha um dia vira pó, e você morre sem nunca ter vivido, e você deixa de existir sem nunca ter sido notado. Você é mais uma cara produzida na foto de mais uma festa produzida, é um coadjuvante feliz dessa palhaçada de teatro que é a vida. Você aceitou tudo, você trocou as incertezas da sua alma pelas incertezas da moça da novela, porque ver os problemas em outros seres irreais é muito mais fácil e leve, além do que, novela dá sono e você não morre de insônia antes de dormir (porque antes de dormir é a hora perfeita para sentir o soco no estômago). Você aceita a vida, porque é o que a gente acaba fazendo para não se matar ou não matar todos os imbecis que escutam você reclamar horas sem fim das incertezas do mundo e respondem sem maiores profundidades: relaaaaaaaaaaaaaxa! Eu não vou fumar, eu não vou cheirar, eu não vou beber, eu não vou engolir, eu não vou fugir de querer me encontrar, de saber que merda é essa que me entristece tanto, de achar um sentido para eu não ser parte desse rebanho podre que se auto-protege e não sabe nem ao certo do quê. Eu não vou relaxaaaaaaaaaaaaaaaaaar. A única verdade que me cala um pouco e, vez ou outra, me transforma em alguém estupidamente normal é que virar um louco selvagem que fala o que pensa, sem amigos e sem namorados, só é legal se você tiver alguém pra contar o quanto você é foda no final do dia. Tati Bernardi
QUERIDO DIÁRIO (TÓPICOS PARA UMA SEMANA UTÓPICA) Segunda-feira: Criar a partir do feio Enfeitar o feio Até o feio seduzir o belo Terça-feira: Evitar mentiras meigas Enfrentar taras obscuras Amar de pau duro Quarta-feira: Magia acima de tudo Drogas, barbitúricos I Ching Seitas macabras O irracional como aceitação do universo Quinta-feira: Olhar o mundo Com a coragem do cego Ler da tua boca as palavras Com a atenção do surdo Falar com os olhos e as mãos Como fazem os mudos Sexta-feira: Assunto de família: Melhor fazer as malas E procurar uma nova (Só as mães são felizes) Sábado: Não adianta desperdiçar sofrimento Por quem não merece É como escrever poemas no papel higiênico E limpar o cu Com os sentimentos mais nobres Domingo: Não pisar em falso Nem nos formigueiros de domingo Amar ensina a não ser só Só fogos de São João no céu sem lua Mas reparar e não pisar em falso Nem nas moitas dos metrôs nos muros E esquinas sacanas comendo a rua Porque amar ensina a ser só Lamente longe, por favor Chore sem fazer barulho Cazuza